Por Renate Krieger

Já dissemos por aqui que este não é um blog de viagem, mas resolvemos separar algumas dicas de Marrocos para quem, como nós, gosta de se aventurar pelo mundo – acompanhado ou não da família.

Ficamos positivamente surpresos com a boa estrutura que o país tem em relação ao turismo. Depois de pegar a balsa – por exemplo, a partir da Espanha – para o Marrocos, quem viaja pelo país de carro, de van ou com a autocaravana tem centenas de campings à disposição. Encontramos até gente que estava fazendo um tour pelo mundo de moto, com a tenda na garupa.

As estradas têm boa qualidade e, fora dos acessos a grandes cidades como a capital, Rabat, os marroquinos dirigem muito bem e de forma tranquila. Penamos um pouco para aprender a dirigir em rotatórias – se há um semáforo antes da entrada na rotatória, é preciso dar preferência aos carros que vêm do lado do sinal de trânsito.

Para quem vai ao país de avião e não aluga carro, também há a opção de ônibus intermunicipais – não houve um dia em que não vimos um na estrada, nas mais diversas rotas. As duas companhias mais citadas por turistas são a Supratours e a CTM. Aparentemente, a rede de trens também é bastante bem estruturada.

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Mosaicos impressionantes em Volubilis, local que mais me marcou no Marrocos

Vivemos o Marrocos como um país muito seguro. Há vigilância em praticamente todas as entradas de cidades e em muitos cruzamentos e checking points nas estradas – especialmente no caminho rumo a Dakhla, no Saara Ocidental.

Já de volta à Europa, o nosso maior choque cultural foram os preços dos campings – ainda mais porque, sem nos darmos conta, desembarcamos da balsa (ferry) em plena Semana Santa, um feriado que nem tínhamos levado em consideração depois de quatro meses num país muçulmano. Chegamos a pagar 24 euros para passar a noite num parque de campismo em Algeciras, a primeira/última parada depois/antes da balsa para o norte da África.

No Marrocos, gastamos, no máximo, 12 euros por noite num camping. O preço, que às vezes era bem mais baixo (cerca de 8 euros), costumava incluir acesso à eletricidade para a nossa caravana, duchas quentes e WiFi. O serviço extra – se disponível – era a máquina de lavar, normalmente a preços europeus (3,50 a 4 euros, mas houve um absurdo em Marrakech, onde nos cobraram 6 euros e nem pudemos colocar a roupa para lavar nós mesmos).

O mesmo choque pode ser “aplicado” ao contexto dos preços da comida, majoritariamente comprada à moda dos marroquinos, nos pequenos comércios das cidades e vilarejos onde passamos. Costumávamos comprar apenas produtos industrializados (iogurte, requeijão ou até vinho marroquino) nos supermercados, onde os preços eram mais altos, mas ainda bem menores que na Europa. E, como já descrevi num texto anterior, costumávamos comprar pouco, também à moda dos marroquinos, que compram legumes, verduras e frutas em pequena quantidade, de acordo com o dinheiro que têm à disposição no dia ou durante a semana.

Vinhas em Chefchaouen, no norte do Marrocos
Vinhas em Chefchaouen, no norte do Marrocos – o país também produz vinho

Como não conhecíamos a cultura turística das caravanas no Marrocos quando fomos para lá, de início optamos sempre pelos campings, vigiados à noite. O que não era garantia de que, de manhã cedo, não seríamos despertados ou abordados por vendedores de peixe fresco, mel, óleo de argan (ou argão) ou legumes e frutas. O que, como tudo, tem seu lado bom (que praticidade!) e seu lado ruim (às vezes era muito difícil convencer os vendedores de que o nosso “não, obrigado” não queria dizer “talvez”).

Uma dica preciosa que recebemos ainda na Espanha foi a de um aplicativo para procurar campings ou estacionamentos onde há possibilidades de passar a noite ao lado de outros “colegas” caravanistas de viagem. Chama-se Park4Night e pode ser utilizado tanto com internet quanto off-line.

Mais uma dica útil: comprar um chip de internet para celular. Pagamos 2 euros (!) pelo chip (20 DH) da Maroc Telecom, mais o crédito que queríamos carregar para navegar – 5 euros chegaram durar dois meses.

A rede funciona em todo o país – foram raras as ocasiões em que ficamos sem sinal (uma delas foi no Paradise Valley, ao norte de Agadir, uma região montanhosa bastante isolada, e a outra foi em Sidi Kaouki, perto de Essaouira, uma praia também isolada e com sinal fraco). É uma vantagem em relação à dependência de redes WiFi, que nem sempre funcionam bem nos campings – mesmo em grandes centros como Marrakech.

Abaixo, a descrição das maiores cidades que visitamos no Marrocos – voltaremos a falar do país num texto futuro, que descreverá as paisagens mais bonitas encontradas por lá.

Chefchaouen

 O que fazer com as crianças – conhecido como “cidade azul”, o centro antigo de Chefchaouen é um aglomerado de casas simples encostado em íngremes montanhas, numa paisagem verde que contrasta com a aridez do sul e do sudeste do país. Portanto, nem pensar em levar o carrinho de bebê – um item, aliás, que nem usamos no Marrocos, por optarmos sempre pelo canguru para a nossa bebê mais nova, que na época da visita à cidade tinha oito meses. A mais velha, agora com três anos, ia ou a pé ou nos ombros do pai, que também carregava a mochila com água e comida para um piquenique improvisado para as crianças.

Esta, aliás, é uma dica que consideramos importante: sempre levávamos um lanche, mesmo quando escolhíamos comer em algum restaurante. Para nós, os restaurantes deixam bastante a desejar no Marrocos, e aprendemos a sempre procurar locais onde víamos a comida sendo feita.

O melhor era comer em pequenos estandes que faziam carne moída grelhada, de preferência ao lado do açougue e de estandes de legumes, onde podíamos escolher o corte de carne e pedir para ser preparado na hora.

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Chefchaouen, nossa primeira parada, conhecida como “cidade azul”

Para as crianças, também aprendemos a pedir sopa de lentilha ou de feijão amarelo, que a nossa mais velha adora. Mas, regra geral, comíamos no motor-home antes de sair para dar passeios, e eu também optei por não desmamar a mais nova e, portanto, tinha sempre o leite materno à disposição.

Em Chefchaouen, há muitos suvenires turísticos. Como foi a primeira cidade que visitamos, resistimos a comprar lembranças e resolvemos nos concentrar apenas na beleza e na tranquilidade da cidade antiga, que oferece inúmeros ângulos para fotografar.

Chefchaouen foi, para nós, o início perfeito da viagem ao Marrocos, onde as medinas e mercados (souks) podem ser bastante estressantes no longo prazo, especialmente com (e para) as crianças. Fica ao pé de duas montanhas, que são conhecidas como “os dois chifres” na língua berbere e aparentemente dão o nome à cidade.

Além da medina, que exploramos a pé vindo do camping municipal – e portanto foi só descida (para subir, pegamos um táxi porque as crianças estavam cansadas), visitamos o riacho onde há uma estação para lavar roupas e que serve de ponto de partida para caminhadas na região. Não nos arriscamos nas íngremes encostas dos morros por causa do cansaço. Preferimos observar a movimentação das pessoas no local e nos cafés improvisados entre as pedras do rio.

Onde ficar – no camping municipal. Custa dez euros (cerca de 10 Dirhams, a moeda local) por noite, com eletricidade que nem sempre funciona. Em dezembro, quando chegamos, choveu bastante e estava frio. As duchas quentes são pagas à parte (1 euro). Os banheiros deixam a desejar, mas não são sujos.

Na cidade antiga, há várias Riads (hotéis que funcionam em casas de estilo marroquino) com preços que variam entre 45 e 150 euros por noite. Quem quer ceder ao “flair” de se hospedar num hotel típico precisa se preparar para espaços bastante exíguos, mesmo para famílias, e subir escadas estreitas e parcamente iluminadas. Mas a vista do terraço sobre a cidade costuma valer a pena – não só em Chefchaouen.

Fès

O que fazer com as crianças – Visitar grandes cidades e medinas no Marrocos com crianças pequenas é um desafio. Ainda estou dividida pelo fato de termos contratado um guia, que segue um preço tabelado (40 euros por dia) e não pode cobrar mais pelo serviço – só ganha mais se os clientes resolverem dar uma gorjeta generosa, o que não foi o nosso caso (demos um extra, mas mais mirrado).

Explico o dividida: o guia nos explicou alguma história da medina medieval, tida como a maior do Norte da África, mas basicamente nos levou para todas as lojas onde as cooperativas de artesanato vendiam os seus produtos. Ou seja: tivemos a impressão de que foi mais um “tour de compras” que uma volta de turismo. E eu passei a desconfiar das cooperativas, conforme expliquei aqui.

Curtição de couro em Fès
Cenário de novela brasileira: curtição de couro em Fès

Por outro lado, gostei que ele dizia aos locais para nos deixarem em paz (as crianças se tornaram um atrativo grande para os marroquinos) e que o passeio não pareceu extremamente longo, apesar de ter durado quatro horas. Passamos rápido pelos locais mais importantes da medina, com destaque para a curtição do couro, tão propagada pela novela brasileira O Clone, de que ainda me lembro – tive meu momento “Jade” (a personagem principal) quando comprei duas babouches (chinelos de couro) por 15 euros, um preço que considerei correto.

Onde ficar – Ficamos nos dois campings da cidade: o Internacional, na primeira noite que passamos por lá, e, na segunda noite, o Diamant Vert, um complexo de camping (mais um estacionamento para caravanas, com ótimas duchas quentes e banheiros) e hotel. Não recomendamos o Internacional, com banheiros muito sujos e mal-estruturado.

Volubilis

O que fazer com as crianças – passear, passear, passear no imenso areal ao ar livre das ruínas romanas de Volubilis, a cerca de 36 km ao norte de Meknès. Apesar de ter sido uma estação no início da nossa viagem, foi o local que mais gostei de visitar no Marrocos.

As ruínas, patrimônio mundial da humanidade da UNESCO, dão uma sensação de tranquilidade, especialmente numa tarde fria de sol. E são um parquinho a céu aberto para crianças.

Inicialmente capital da Mauritânia, Volubilis foi fundada no século 3 A.C. e se tornou um pilar importante do Império Romano, ao qual foi anexada em 40 D.C., juntamente com a Mauritânia Ocidental. Foi dotada de vários edifícios importantes, entre eles um muro com nove pórticos e quase quarenta torres, além de um Arco do Triunfo, termas e um aqueduto.

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Arco do Triunfo em Volubilis

O que mais me impressionou, no entanto, foram os mosaicos, em excelente estado de conservação.

Fiquei um pouco decepcionada pela falta de informações mais precisas no local. Há um areal inicial com algumas plaquinhas contendo dados históricos antes de se começar a visita, mas não há quase nenhuma placa explicando sobre os diferentes monumentos (li sobre o Arco do Triunfo no início do passeio). Talvez seja por isso que haja muitos guias turísticos oferecendo um passeio pelo local, que não sei se é muito mais detalhado. Pela minha experiência, é necessário negociar o preço antes de iniciar o tour para evitar surpresas.

Onde ficar – ficamos no camping Zerhoun Bellevue. Não cheguei a testar os chuveiros porque não gostei muito da limpeza do local. Além disso, estava tarde quando chegamos e partimos cedo no dia seguinte. Para isso, recomendo.

Marrakech

O que fazer com as crianças – já tínhamos ido a Marrakech uma vez, antes de eu ficar grávida da minha filha mais velha. Por isso, desta vez, evitamos fazer turismo na cidade e usamos Marrakech apenas como uma parada intermediária na passagem entre Meknès e Essaouira, e também durante a volta.

Como acredito que existem muitos guias excelentes sobre Marrakech por aí, destaco apenas a incontornável praça Jamaa El-Fna, cujos estandes de venda de carne cozida fascinam o meu marido e são uma boa pedida também para alimentar crianças pequenas.

É preciso paciência para enfrentar a confusão de pessoas que vão a essa praça todos os dias, mas principalmente os homens que fazem “marketing” para os estandes. Só falta agarrarem os turistas para fazê-los sentarem às mesas, o que nos irritou bastante e gerou algumas discussões, durante as quais pedimos que eles nos deixassem em paz (porém, acho que o jeito é mesmo sorrir e dizer não gentilmente, aceitando que esta é uma marca do local). Também prestei atenção redobrada para que não ficassem pegando nas crianças, algo de que não gosto nada.

Mas a barraca 13 se tornou nossa favorita, e nos fartamos de comer língua e carne de cabeça de boi, carne cozida e pão mergulhado num molho que estava cozinhando há muitas, muitas e muitas horas e fica com um gosto delicioso. Há também oferta de carne de ovelha que despedaça de tão macia, e outras iguarias como cérebro de ovelha e tetas de vaca (não nos sentimos tentados a experimentar a primeira e comemos a segunda, mas é muito esponjosa para o meu gosto).

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Essaouira, cidade turística (encontrei havaianas) e artística

Onde ficar – em dois estacionamentos vigiados ao lado e cinco minutos a pé da praça Jamaa El-Fna.

Também recomendamos dois campings: o Relais de Marrakech (evitem o restaurante, que serve purê de batatas do pacote a preços altos e tem outros serviços, como máquina de lavar, a caros seis euros) e o Ourika Camp, o nosso preferido. Apesar de ficar mais longe da cidade (11 km), tem uma maravilhosa piscina para as crianças e ótima infraestrutura, especialmente no que diz respeito a banheiros e chuveiros, muito limpos.

Essaouira

O que fazer com crianças – Essaouira (chegou a ser colônia portuguesa no século XV que, antes da independência do Marrocos, também era conhecida como Mogador) é uma cidade turística à beira-mar. Não nos atraiu muito por esse aspecto, em que tudo é mercantilizado (até o fato de ser um ponto que atrai surfistas é propagado ad nauseam em camisetas e dizeres pela cidade. Também encontrei havaianas e até um daqueles sacos de “Café do Brasil” transformados em bolsa). Por isso, também não compramos suvenires mais “típicos” do Marrocos ali (como tagines, por exemplo), por não nos parecerem autênticos.

Mas, como aprendemos, praticamente tudo no Marrocos é uma questão de paciência e de saber procurar. Quando nos embrenhamos pelas estreitas ruelas da cidade antiga (outro patrimônio cultural da UNESCO), conseguimos encontrar um calígrafo que fazia lindos trabalhos em nanquim, traduzindo vários ditados internacionais para o árabe.

E Essaouira também é conhecida por ser uma cidade de artistas. Não é um programa tão empolgante para crianças, mas vale a pena procurar um pouco mais e gastar minutos admirando as lojinhas e as várias galerias de arte espalhadas pelo local.

Onde ficar – ou no estacionamento (sem vigilância) perto da praia, ou no camping municipal de Essaouira.

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